quinta-feira, 19 de maio de 2011

Às vezes

Às vezes é preciso aprender a perder, a ouvir e não responder, a falar sem nada dizer, a esconder o que mais queremos mostrar, a dar sem receber, sem cobrar, sem reclamar. Às vezes é preciso respirar fundo e esperar que o tempo nos indique o momento certo para falar e então alinhar as ideias, usar a cabeça e esquecer o coração, dizer tudo o que se tem para dizer, não ter medo de dizer não, não esquecer nenhuma ideia, nenhum pormenor, deixar tudo bem claro em cima da mesa para que não restem dúvidas e não duvidar nunca daquilo que estamos a fazer.
E mesmo que a voz trema por dentro, há que fazê-la sair firme e serena, e mesmo que se ouça o coração bater desordeiramente fora do peito é preciso domá-lo, acalmá-lo, ordenar-lhe que bata mais devagar e faça menos alarido, e esperar, esperar que ele obedeça, que se esqueça, apagar-lhe a memória, o desejo, a saudade, a vontade.
Às vezes, é preciso partir antes do tempo, dizer: aquilo que mais se teme dizer, arrumar a casa e a cabeça, limpar a alma e prepará-la para um futuro incerto, acreditar que esse futuro é bom e afinal já está perto, apertar as mãos uma contra a outra e pedir a Deus que nos dê força e serenidade. Pensar que o tempo está a nosso favor, que a vontade de mudar é sempre mais forte, que o destino e as circunstâncias se encarregarão de atenuar a nossa dor e de a transformar numa recordação ténue e fechada num passado sem retorno que teve o seu tempo e a sua época e que um dia também teve o seu fim.
Às vezes mais vale desistir do que insistir, esquecer do que querer, arrumar do que cultivar, anular do que desejar. No ar ficará para sempre a dúvida se fizemos bem, mas pelo menos temos a paz de ter feito aquilo que devia ser feito. Somos outra vez donos da nossa vida e tudo é outra vez mais fácil, mais simples, mais leve, melhor.
Às vezes é preciso mudar o que parece não ter solução, deitar tudo a baixo para voltar a construir do zero, bater com a porta e apanhar o último comboio no derradeiro momento e sem olhar para trás, abrir a janela e jogar tudo borda-fora, queimar cartas e fotografias, esquecer a voz e o cheiro, as mãos e a cor da pele, apagar a memória sem medo de a perder para sempre, esquecer tudo, cada momento, cada minuto, cada passo e cada palavra, cada promessa e cada desilusão, atirar com tudo para dentro de uma gaveta e deitar a chave fora, ou então pedir a alguém que guarde tudo num cofre e que a seguir esqueça o segredo.
Às vezes é preciso saber renunciar, não aceitar, não cooperar, não ouvir nem contemporizar, não pedir nem dar, não aceitar sem participar, sair pela porta da frente sem a fechar, pedir silêncio, paz e sossego, sem dor, sem tristeza e sem medo de partir. E partir para outro mundo, para outro lugar, mesmo quando o que mais queremos é ficar, permanecer, construir, investir, amar.
Porque quem parte é quem sabe para onde vai, quem escolhe o seu caminho e mesmo que não haja caminho porque o caminho se faz a andar, o sol, o vento, o céu e o cheiro do mar são os nossos guias, a única companhia, a certeza que fizemos bem e que não podia ser de outra maneira. Quem fica, fica a ver, a pensar, a meditar, a lembrar. Até se conformar e um dia então esquecer.

sábado, 14 de maio de 2011

Paixão

Não há nada melhor do que estar apaixonado. Nem pior. Primeiro estranha-se, depois, entranha-se. A paixão dá para tudo. Para rir e chorar, fazer confidências, namorar ao luar a beber coca-colas de lata e sentir-se mais feliz do que  se estivesse numa suite do trigésimo andar do Pierre em Manhattan a beber Don Perignon.
Estar apaixonado é um estado de graça e de desgraça. Tira o sono e dá speed. Rouba a fome e mata a sede. Perde-se a noção do tempo, espaço, até do ridículo. Ganha-se força, vontade, desejo e anos de vida. Estar apaixonado é investir uma fortuna que demorou anos a amealhar num negócio de alto risco. E ainda por cima fazê-lo conscientemente. Porque a paixão é melhor do que qualquer bebida, droga ou paraíso terrestre. Uma pessoa apaixonada vai onde quer porque passa de repente a desconhecer os seus limites. Vê-se sem perceber bem como a fazer coisas impensáveis.

sábado, 7 de maio de 2011

Ah, minha mãe...

Me ouve, me atura, me trava as inseguranças, me acalma os nervos, me limpa as lágrimas e me lambe as feridas. Conhece-me como ninguém, talvez melhor do que eu me conheço.
Tenho saudades dela (quando estou longe). É como se tivesse a resposta certa para tudo. Habituei-me a não dar um passo na vida sem lhe perguntar, mesmo que depois faça tudo ao contrário.

Eu te amo muito, mãe!